Christiano Antonucci/Secom-MT
Otaviano Pivetta; por enquanto, está contornada a possibilidade de instalação de uma CPI (Comissão Parlamentar de Inquérito) sobre as operações consignadas
Assumindo um compromisso muito mais pessoal e em cima de sua credibilidade pessoal, do que a do próprio Governo do Estado, o governador em exercício de Mato Grosso, Otaviano Pivetta (Republicano), e o presidente da Assembleia Legislativa, Max Russi (ainda no PSB), mais a claque de deputados que ainda apoiam o Governo Mauro Mendes (União) – somado às decisões do presidente do Tribunal de Contas de Mato Grosso, conselheiro Sérgio Ricardo -, contornaram a possibilidade, pelo menos por enquanto, de instalação de uma CPI (Comissão Parlamentar de Inquérito) sobre as operações consignadas.
Com mais de 300 mil operações de empréstimos, cartões e crédito e cartões de benefícios, o Governo do Estado entregou o projeto de Lei que endurece as regras e coloca mais trava para se evitar o que hoje é inevitável e, por enquanto insuperável, que é o superendividamento do servidor do Poder Executivo.
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Essas operaçao são consignadas, ou seja, têm como garantia o salário dos mais de 62 mil servidores públicos. que operaram junto às empresas de crédito e, que, juntas, somaram mais de R$ 4,6 bilhões nos últimos 36 meses – sendo R$ 1,7 bilhão, entre os meses de maio de 2024 à Abril de 2025,
O projeto aprovado diz que “a margem consignável, para consignações facultativas, não poderá ultrapassar 35% da remuneração líquida mensal do servidor, na forma de regulamento”. O artigo 3º cita que “fica terminantemente vedada, a partir da publicação desta Lei, a abertura de margem consignável para operações de cartão de crédito e cartão benefício de consignação e outros congêneres”.
De um total de 104.119 servidores do Poder Executivo, 62.135 realizaram uma média de cinco operações de empréstimos, cartão de crédito e cartão de benefícios. Ou seja, 60% do total da força de trabalho do Governo do Estado estão comprometidos com dividas, sendo que, desse total, 42,5% excederam os limites normativos que eram mantidos por decretos precários.
Admitir, reparar e controlar. Essas foram as palavras, que Otaviano Pivetta mais repetiu aos jornalistas, antes de entregar a Mensagem do Poder Executivo com o projeto de Lei.
A medida dispõe sobre limites e condições para as consignações em folha de pagamento dos servidores públicos civis e militares, ativos e inativos, e seus pensionistas, e se aplica a todos os poderes e órgãos autônomos do Estado de Mato Grosso.
De forma célere como a medida exige, os deputados realizaram três sessões e apreciaram e aprovaram o novo projeto, lembrando que, nas três sessões, foram apresentadas seis emendas que foram desconsideradas e transformadas em um substitutivo integral.
Já no Colégio de Líderes, Pivetta reafirmou o compromisso de transparência total e de rigoroso controle para minimizar os impactos do estrago financeiro provocado pelas operações consignadas, além do ‘strike’ político que reverbera em todo Mato Grosso, já que, ao final das apurações, se elas tiverem um fim, pode-se ter um volume de recursos “roubados do servidor público”, como faz questão de afirmar, todos os dias, o ex-governador, ex-senador e ex-procurador da República, Pedro Taques, que, por meio da AFG&Taques Advogados Associados, assumiu a defesa de seis sindicatos representativos do funcionalismo público e da Federação Sindical dos Servidores Públicos do Estado de Mato Grosso (FESSP/MT).
“O Governo do Estado reconhece o erro, está trabalhando. Prova disto é este projeto de Lei, construído a várias mãos, vai reparar prejuízos que ficarem comprovados, e está endurecendo as regras para que o servidor público não perca mais o controle de suas finanças”, disse o governador.
Ele defendeu ainda que o Governo de Mato Grosso vá mais longe ao trabalhar, ajudar e ensinar o servidor a não comprometer sua renda além do necessário e somente em caso de emergência, “pois todos passam dificuldades”.
O chefe interino do Poder Executivo não soube precisar o montante que o Estado de Mato Grosso arrecadava com a cobrança de juros de 7,8% do total emprestado dos bancos e financeiras, enquanto os sindicatos e representantes falavam em somas que ultrapassariam os R$ 150 milhões, levando em consideração o desembolso anual para as empresas consignatárias que, entre maio de 2024 e abril de 2025, somaram R$ 1,7 bilhão;
O projeto de Lei entregue para apreciação dos deputados já estabelece o fim da cobrança.
Certo mesmo é que a presença de Otaviano Pivetta e seu compromisso pessoal com os deputados, somado a uma gigantesca “vaidade ideológica”, segundo um deputado governista, levou a apresentação de dois requerimentos distintos de instalação da CPI dos Consignados, cada um com quatro assinaturas.
O primeiro, dos deputados Lúdio Cabral e Henrique Lopes, ambos do PT; e o segundo, do deputado Gilberto Cattani (PL).
Em ambos estavam as assinaturas da deputada Janaina Riva (MDB) e do presidente Max Russi (PSB). Janaina defende a CPI, para que se possa chegar à apuração necessária, “pois ainda tem muita coisa a ser esclarecida e apurada”.
É importante lembrar que, segundo o Regimento Interno da Assembleia Legislativa, um requerimento de instalação de uma CPI com oito assinaturas já garante a efetividade da medida.
Max Russi acredita que uma CPI só se demonstraria necessária se não estivesse havendo apuração em várias frentes. Ele lembrou que a falta de uma legislação mais endurecida acabou provocando o caos financeiro e o superendividamento do servidor público do Poder Executivo.
O recado de Russi foi para o próprio Governo Mauro Mendes (UB), que contestou, no Tribunal de Justiça, a constitucionalidade da Lei 11.033/2019, que foi fruto de um trabalho decorrente da CPI dos Consignados de 2018/2019 e que o próprio governador não quis sancionar, deixando para o então presidente da Assembleia Legislativa, Eduardo Botelho (União), promulgar a lei.
“Acreditar que banco não quer lucro é, no mínimo, uma incredulidade. Se os apontamentos da CPI de 2018/2019 tivessem sido seguidos, talvez a situação não estivesse tão caótica”, observou Max Russi.
Ele assinalou novamente que todos têm que aguardar e acreditar no trabalho do Tribunal de Contas; do Ministério Público e da Polícia Judiciária Civil, para então: “não resolvendo, os deputados lançarem mão deste importante instrumento que é uma CPI, mas de forma consistente, que apure com rigor e aponte soluções e que leve o Governo a adotar as medidas, pois no passado não adotou e virou o que virou”.
Tão logo a lei entrou em vigor, no final do ano de 2019, o Governo Mauro Mendes ingressou com ADI (Ação Direta de Inconstitucionalidade), que foi acolhida pelos desembargadores do Órgão Especial do Tribunal de Justiça, com a simplória e empobrecida justificativa de “vicio de iniciativa”.
A ausência de uma legislação e a recorrente e frágil justificativa de decretos regulamentares, que são mais precários do que a lei contestada, acabaram por provocar o quadro de caos e endividamento dos servidores do Poder Executivo, têm repetidamente declarado os representantes do funcionalismo público.
Max Russi chegou a repetir que a força-tarefa do Governo do Estado pode também ajudar na apuração, mas sem a presença do secretário de Planejamento e Gestão, Basílio Bezerra Guimarães, que está na Ásia, acompanhandoo governador Mauro Mendes, em missão oficial.
O certo mesmo é que, a partir da sanção da lei aprovada pelos deputados estaduais nesta quarta-feira (11), as regras, se forem cumpridas, tendem a endurecer o processo para todos os lados: para os bancos, para as empresas consignatárias e também para os servidores públicos.
Afinal,é necessário que os levantamentos dos problemas passados sejam corrigidos e uma nova negociação seja realizada, sob pena de o funcionalismo continuar sem fôlego. Ou seja, sem valores a receber mensalmente, pois os descontos vão permanecer. Resta saber se nos mesmos patamares que levaram ao superendividamento ou em valores mais realistas.
“Os créditos vão naturalmente se esgotar, pois, se não se tiver segurança jurídica, quem empresta não vai correr o risco de ficar sem receber. O empréstimo consignado deveria ter juros baixos, por ter a certeza do pagamento, já que ele é descontado pelo patrão, no caso o Governo do Estado, diretamente no salário do servidor que tomou o empréstimo, antes da liberação da folha de pagamento”, disse Antônio Wagner, presidente do Sinpaig.
O presidente do Tribunal de Contas, Sérgio Ricardo, lembrou que, a partir da aprovação desta nova lei, se terá dois momentos.
“O primeiro se trata da definição de novas regras e parâmetros para operacionalizar empréstimos, cartões de crédito ou cartões benefícios consignados, até porque a nova lei impõe limites e regras novas. O segundo momento é o da apuração das falhas e irregularidades passadas, que terão que ser revistas e se constatado abusos, haja o devido ressarcimento”, afirmou.
Aliás, nesta quinta-feira (12), a Mesa Técnica do TCE/MT se reúne e dá prosseguimento à sua apuração dos fatos passados, em busca de tentar tirar os servidores do emaranhado de empréstimos e apontar responsáveis.
O governador Otaviano Pivetta, tão logo entregou a apreciação dos deputados do projeto de Lei já aprovado, assegurou que os órgãos de controle do Poder Executivo têm total condição de apontar os erros e promover a correção. Inclusive, com a reparação de danos e ressarcimento de prejuízos.