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Descontrolado, Trump torna os EUA adversários do Brasil, diz ex-embaixador em Washington – CartaCapital


A decisão do presidente Donald Trump de taxar em 50% a importação de produtos brasileiros torna os Estados Unidos adversários do Brasil, uma mudança drástica em uma relação diplomática de 201 anos. A avaliação é de Roberto Abdenur, embaixador do Brasil em Washington entre 2004 e 2006, em entrevista a CartaCapital.

Em uma carta enviada ao presidente Lula (PT), Trump voltou a chamar de “caça às bruxas” o processo no Supremo Tribunal Federal contra Jair Bolsonaro (PL) pela tentativa de golpe de Estado. O magnata classificou o tratamento ao ex-capitão como uma “vergonha internacional” e disse que o julgamento “não deveria acontecer”.

“Isso ocorre de uma maneira anômala, com um presidente dos Estados Unidos completamente descontrolado, que não tem limites”, critica Abdenur. “E em defesa de um ex-presidente golpista, que só não logrou sucesso na empreitada pela resistência de uns poucos militares — porque muitos estavam dispostos a embarcar no golpe.”

Para o experiente diplomata, trata-se de uma decisão “revoltante” e de “uma brutalidade diplomática”.

Roberto Abdenur tem uma larga experiência na área: chegou ao Itamaraty em 1963 e se afastou em 2007. Testemunhou da Guerra Fria à invasão do Iraque, passando pelo fim da União Soviética.

Como homem-forte de Lula em Washington, teve a difícil missão de reduzir a resistência da Casa Branca ao primeiro governo de esquerda do Brasil pós-redemocratização. O resultado foi positivo e o petista construiu uma relação harmoniosa com o republicano George W. Bush.

Em 2024, Brasil e Estados Unidos celebraram 200 anos de relações diplomáticas. No marco inicial, em 26 de maio de 1824, o então presidente James Monroe recebeu o então encarregado de Negócios do Brasil, José Silvestre Rebello, para reconhecer a independência brasileira e estabelecer vínculos com o recém-criado Estado.

Segundo Abdenur, as relações evoluíram da adversidade para a parceria, com o auge nos governos de Barack Obama. Agora, avalia, Trump põe tudo a perder. “Os Estados Unidos passam a ser adversários de uma maneira anormal.”

Além da manifestação institucional do governo Lula, diz o ex-embaixador, é necessário um “tsunami” da sociedade civil: mercado, agro, indústria, comércio e direito, unidos em torno de uma resposta contundente. No plano político, defende, a embaixada brasileira e outros atores nacionais devem entrar em contato com representantes do Partido Democrata para incentivar uma reação.

“É muito importante penetrar no território inimigo e estimular as manifestações de uma força de oposição a esse inimigo”, resume. Não se deve descartar, por fim, a possibilidade de o Brasil aplicar tarifas a produtos americanos, como reciprocidade, de acordo com Abdenur.

Em nota oficial, o governo Lula reforçou que o Brasil “é um país soberano com instituições independentes que não aceitará ser tutelado por ninguém”. No aspecto comercial, ressalta o Palácio do Planalto, é falsa a alegação sobre um déficit norte-americano.

“As estatísticas do próprio governo dos Estados Unidos comprovam um superávit desse país no comércio de bens e serviços com o Brasil da ordem de 410 bilhões de dólares ao longo dos últimos 15 anos”, enfatiza a gestão Lula. “Neste sentido, qualquer medida de elevação de tarifas de forma unilateral será respondida à luz da Lei brasileira de Reciprocidade Econômica.”

Leia a íntegra da carta de Trump a Lula e, na sequência, a nota do governo brasileiro em resposta aos Estados Unidos:

Carta de Trump:

“Conheci e tratei com o ex-Presidente Jair Bolsonaro, e o respeitava muito, assim como a maioria dos outros Líderes de Países. A maneira como o Brasil tem tratado o ex-Presidente Bolsonaro, um Líder Altamente Respeitado em todo o Mundo durante seu Mandato, inclusive pelos Estados Unidos, é uma desgraça internacional. Este Julgamento não deveria estar acontecendo. É uma Caça às Bruxas que deve terminar IMEDIATAMENTE!

Devido, em parte, aos ataques insidiosos do Brasil às Eleições Livres e aos direitos fundamentais de Liberdade de Expressão dos americanos (como recentemente ilustrado pelo Supremo Tribunal Federal brasileiro, que emitiu centenas de Ordens de Censura SECRETAS e ILEGAIS para plataformas de Mídias Sociais dos EUA, ameaçando-as com Milhões de Dólares em Multas e Expulsão do mercado brasileiro de Mídias Sociais), a partir de 1º de agosto de 2025, cobraremos do Brasil uma Tarifa de 50% sobre todos e quaisquer produtos brasileiros enviados aos Estados Unidos, separada de todas as Tarifas Setoriais. Mercadorias redirecionadas para evitar esta Tarifa de 50% estarão sujeitas a essa Tarifa mais alta.

Além disso, tivemos anos para discutir nossa Relação Comercial com o Brasil e concluímos que devemos nos afastar da relação comercial de longa data e muito injusta gerada pelas Políticas Tarifárias e Não Tarifárias do Brasil e pelas Barreiras Comerciais. Nossa relação tem sido, infelizmente, longe de Recíproca.

Por favor, entenda que o número de 50% é muito menos do que o necessário para termos o Campo de Jogo Nivelado que devemos ter com seu País. E isso é necessário para retificar as graves injustiças do regime atual. Como você sabe, não haverá Tarifa se o Brasil, ou empresas dentro do seu País, decidirem construir ou fabricar produtos nos Estados Unidos e, de fato, faremos tudo o possível para obter aprovações de forma rápida, profissional e rotineira —em outras palavras, em questão de semanas.

Se, por qualquer motivo, você decidir aumentar suas Tarifas, então, qualquer que seja o número que você escolher para aumentá-las, será adicionado aos 50% que cobramos. Por favor, entenda que essas Tarifas são necessárias para corrigir os muitos anos de Políticas Tarifárias e Não Tarifárias do Brasil e Barreiras Comerciais, causando esses Déficits Comerciais insustentáveis contra os Estados Unidos. Este Déficit é uma grande ameaça à nossa Economia e, de fato, à nossa Segurança Nacional! Além disso, devido aos contínuos ataques do Brasil às atividades de Comércio Digital das Empresas Americanas, bem como outras Práticas Comerciais injustas, estou orientando o Representante de Comércio dos Estados Unidos, Jamieson Greer, a iniciar imediatamente uma Investigação da Seção 301 sobre o Brasil.

Se você desejar abrir seus Mercados Comerciais até agora fechados para os Estados Unidos e eliminar suas Políticas Tarifárias e Não Tarifárias e suas Barreiras Comerciais, nós talvez consideremos um ajuste a esta carta. Essas Tarifas podem ser modificadas, para cima ou para baixo, dependendo de nosso relacionamento com seu País. Você nunca ficará desapontado com os Estados Unidos da América.

Obrigado por sua atenção a este assunto!”

Nota do governo Lula:

“O Brasil é um país soberano com instituições independentes que não aceitará ser tutelado por ninguém.

O processo judicial contra aqueles que planejaram o golpe de estado é de competência apenas da Justiça Brasileira e, portanto, não está sujeito a nenhum tipo de ingerência ou ameaça que fira a independência das instituições nacionais.

No contexto das plataformas digitais, a sociedade brasileira rejeita conteúdos de ódio, racismo, pornografia infantil, golpes, fraudes, discursos contra os direitos humanos e a liberdade democrática.

No Brasil, liberdade de expressão não se confunde com agressão ou práticas violentas. Para operar em nosso país, todas as empresas nacionais e estrangeiras estão submetidas à legislação brasileira.

É falsa a informação, no caso da relação comercial entre Brasil e Estados Unidos, sobre o alegado déficit norte-americano. As estatísticas do próprio governo dos Estados Unidos comprovam um superávit desse país no comércio de bens e serviços com o Brasil da ordem de 410 bilhões de dólares ao longo dos últimos 15 anos.

Neste sentido, qualquer medida de elevação de tarifas de forma unilateral será respondida à luz da Lei brasileira de Reciprocidade Econômica.

A soberania, o respeito e a defesa intransigente dos interesses do povo brasileiro são os valores que orientam a nossa relação com o mundo”.



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