O ministro Gilmar Mendes, do Supremo Tribunal Federal (STF), concedeu habeas corpus e determinou a revogação da prisão preventiva do empresário João Gustavo Ricci Volpato, apontado como principal articulador do esquema criminoso no Tribunal de Justiça de Mato grosso (TJMT) desarticulado pela Operação Sepulcro Caiado. A decisão foi tomada com base na ausência do requisito da contemporaneidade entre os crimes alegados e a decretação da prisão.
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A operação resultou na prisão de 11 pessoas – sendo 8 advogados. Com a decisão de Mendes, as defesas dos demais presos devem pedir a extensão do habeas corpus que liberou Volpato para os outros acusados.
O esquema foi desarticulado pela Polícia Civil. Além de Volpato, também foram detidos preventivamente o conselheiro suplente da Ordem dos Advogados do Brasil, Rodrigo Marinho, outros advogados e familiares do empresário.
Segundo as investigações, João Gustavo teria usado empresas sob seu controle, como a RV Empresa de Cobrança LTDA, para ajuizar execuções judiciais baseadas em dívidas inexistentes. Os processos, ainda conforme as investigações, eram patrocinados pelo escritório França & Moraes, de Wagner Vasconcelos de Moraes e sua sócia e esposa, Melissa França Praeiro.
O advogado de defesa de Volpatto, Pedro Henrique Ferreira Marques, alegou que o decreto de prisão preventiva é ilegal, por duas razões. Primeiro, por ter sido expedido por juiz incompetente, que usurpou a competência originária do STJ. Segundo, porque a prisão preventiva não seria adequada para crimes que, conforme atesta a própria polícia, foram praticados até 2023 – a indicar que o requisito da contemporaneidade não está preenchido.
Em sua decisão, o ministro afirmou que, quanto à tese de afronta à competência originária do STJ, considerou que, nos documentos acostados aos autos, ainda é prematura a alegação de que o juízo de Cuiabá ignorou deliberadamente indícios de envolvimento de autoridade com foro no STJ – o que, se identificado, diz ele, importaria a nulidade das decisões de primeira instância.
Mendes destacou que os autos demonstram que, depois da decisão que, em 23 de julho, determinou a prisão do investigado, a presidência do STJ informou ao juiz de primeiro grau sobre a sindicância que tramita naquela Corte e avocou o inquérito policial.
Entretanto, o ministro ressaltou que não há como afirmar, com base nos documentos juntados pela defesa, que o juiz de Cuiabá tinha conhecimento prévio de indícios de envolvimento de autoridade com foro no STJ.
Segundo sua análise, até o momento não há nem mesmo a indicação precisa de quais elementos seriam esses e de qual autoridade estaria envolvida.
O ministro explicou que os supostos crimes de estelionato foram praticados contra o Tribunal de Justiça entre os anos de 2019 e 2023 – período em que os investigados teriam apresentado procurações e comprovantes de pagamentos falsos em dezessete execuções cíveis, para enganar juízes e desviar recursos da conta única de depósitos do TJMT.
E diz que embora a decisão impugnada “alegue genericamente” que a investigação ainda está em curso e que podem ser identificados outros atos mais recentes, o ministro observou que, até agora, “os supostos crimes de estelionato, peculato e falsificação de documentos se consumaram até março de 2023 – e não além disso”.
“Há, portanto, um hiato de mais de dois anos entre o último dos atos executórios praticados pelos investigados e a data de deflagração da operação, quando foi decretada a prisão do paciente. Isso demonstra o não preenchimento do requisito da contemporaneidade, que é necessário para a decretação de prisões processuais”.
O “requisito da contemporaneidade” refere-se à exigência de que os motivos que justificam uma medida cautelar, como a prisão preventiva, sejam atuais e relevantes no momento em que a medida é decretada.
Diante disso, o ministro concluiu que os fatos investigados não são contemporâneos ao decreto de prisão, “o que, por si só, justifica a revogação da ordem expedida pelo juízo de primeira instância, e depois ratificada pelo STJ”.