Defesa do ex-presidente tinha até as 20h34 desta 6ª feira (22.ago) para se manifestar sobre descumprimento de medidas impostas pela corte
A defesa do ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) apresentou nesta 6ª feira (22.ago.2025) manifestação ao STF (Supremo Tribunal Federal) sobre o possível descumprimento de medidas cautelares e o “risco de fuga” apontados pelo ministro Alexandre de Moraes e pela PF (Polícia Federal). O prazo de 48 horas determinado pelo magistrado havia sido fixado na 4ª feira (20.ago).
Sobre o rascunho de pedido de asilo na Argentina, datado de fevereiro de 2024, a defesa afirma que se trata de documento jamais utilizado, reforçando que não configura planejamento de fuga. “Fato é que, com ou sem o rascunho, o ex-presidente não fugiu. Pelo contrário, obedeceu a todas as decisões emanadas pela C. Suprema Corte, inclusive a que o proibia de viajar ao exterior, respondeu à denúncia oferecida, compareceu a todas as audiências, sempre respeitando todas as ordens deste E. STF”, afirmaram os advogados.
Os advogados também criticaram a divulgação do documento, afirmando que a intenção da PF seria “gerar manchetes” nacionais e internacionais sugerindo que Bolsonaro teria planejado deixar o país. “Nada mais falso, mas nada mais impactante”, afirmam, especialmente por se dar pouco antes do julgamento, marcado para começar em 2 de setembro. Eles consideram a alegação uma tentativa de desmoralizar o ex-presidente.
USO DE REDES SOCIAIS
Segundo os advogados, há uma diferença entre WhatsApp e redes sociais. Alegam que Bolsonaro nunca foi proibido de usar o aplicativo, trocar mensagens ou se manifestar por meio dele. O WhatsApp, afirmam, é uma plataforma de mensagens privadas e protegida por criptografia ponta a ponta. Já as redes sociais seriam projetadas para construção de perfis públicos, criação de novas conexões e disseminação de conteúdos, funcionando de forma diferente.
Ainda de acordo com os advogados, uma mensagem enviada via WhatsApp pelo ex-presidente e publicada por terceiros em redes sociais, por exemplo, não poderia ser atribuída a ele como tentativa de obstrução ou golpe de Estado. Além disso, citam que o próprio Bolsonaro teria afirmado que não poderia se manifestar para não se “complicar”. Quanto a pedidos para que outras pessoas postassem mensagens, a defesa diz que o ex-chefe do Executivo não motivou ninguém.
“Enfim, o relatório da Polícia Federal só demonstra sua parcialidade e faz lembrar que essa mesma Polícia Federal foi responsável pela triagem de todas as mensagens que foram utilizadas pela acusação no processo penal”, afirmam.
O documento entregue ao STF nesta 6ª feira (22.ago) também diz que mensagens enviadas por listas de transmissão no WhatsApp não seriam uma violação, já que alcançam apenas contatos salvos por Bolsonaro no telefone. A defesa critica ainda o que considera uma interpretação exagerada das medidas cautelares, que teria tentado incriminar comunicações privadas.
“A tentativa de incriminar o envio de mensagens privadas para sua lista de contatos é, de um lado, dar uma interpretação elástica às medidas cautelares impostas que, pelo contrário, deveriam ter sempre leitura restrita e precisa”, diz
ENTENDA
Depois de receber a manifestação da defesa, Moraes deve encaminhar os autos à PGR (Procuradoria Geral da República), que terá o mesmo prazo de 48 horas para se pronunciar.
No despacho de 4ª feira (20.ago), Moraes citou indícios de tentativa de fuga do ex-presidente e atuação em redes sociais apesar das restrições. Segundo a PF, vídeos e mensagens disseminados por Bolsonaro e aliados teriam como objetivo mobilizar reação pública contra sanções da Lei Magnitsky e pressionar autoridades do STF.
Leia o que foi apontado pela PF:
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instruções de Silas Malafaia: o pastor e aliado de Bolsonaro enviou vídeos e mensagens como “ATENÇÃO! Dispara esse vídeo às 12h” e “Se você se sente participante desse vídeo, compartilhe! Não podemos nos calar!”, incentivando o ex-presidente a difundi-los em suas listas de transmissão. Malafaia ainda pediu que Bolsonaro motivasse deputados a publicar os conteúdos;
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atividade nas manifestações de 3 de agosto de 2025: no dia dos atos contrários ao STF, o telefone de Bolsonaro registrou intensa movimentação no WhatsApp, com compartilhamento de vídeos sobre sanções da Lei Magnitsky contra Moraes e promoção dos eventos. Os conteúdos foram replicados centenas de vezes em diversos grupos;
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uso de intermediários para comunicação pública: Bolsonaro orientou o deputado federal Capitão Alden a transmitir vídeos durante uma manifestação na Bahia, limitando sua própria participação para não violar a proibição de comunicação direta. Em mensagem, disse: “Alden, se eu falar qualquer coisa, dá problema. Você pode ligar para mim na imagem falando: ‘Estou aqui com a imagem do Bolsonaro, está mandando abraço a todos vocês e parabenizando’. Aí você pode. Você fala. Eu não posso falar, não”;
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publicações por terceiros: o ex-presidente enviou fotos suas de casa, com mensagens como “De casa acompanhando. Obrigado a todos. Pela nossa liberdade. Jair Bolsonaro”, para que apoiadores compartilhassem em redes sociais;
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estratégia de listas de transmissão: Bolsonaro utilizou ao menos 4 listas no WhatsApp (“Deputados”, “Senadores”, “Outros” e “Outros 2”) para difundir os conteúdos, replicando, segundo a PF, um modelo de “milícias digitais”, com grande volume de mensagens e múltiplos canais de disseminação.
O documento final entregue ao STF indiciou Bolsonaro e o deputado federal Eduardo Bolsonaro (PL-SP) por coação no curso da investigação sobre a tentativa de golpe de Estado. O inquérito apura a atuação de Eduardo nos Estados Unidos, onde ele teria articulado medidas de pressão e sanções contra autoridades brasileiras. O relatório de 170 páginas traz detalhes das conversas entre pai e filho.
Em uma delas, o congressista xinga o ex-presidente. Há também no relatório uma minuta que seria um pedido de asilo de Bolsonaro ao presidente da Argentina, Javier Milei (La Libertad Avanza, direita).
A investigação foi aberta em maio por determinação de Moraes. O relatório final da PF conclui que Bolsonaro e Eduardo, com apoio do jornalista Paulo Figueiredo e do pastor Silas Malafaia, atuaram para interferir no processo em que o ex-presidente é acusado de tentar dar um golpe de Estado depois de perder as eleições de 2022 para Luiz Inácio Lula da Silva (PT).
Segundo a PF, as ações de Eduardo e dos demais investigados têm como alvo direto instituições democráticas, principalmente o STF e o Congresso Nacional, para submetê-las a interesses pessoais. O relatório detalha que o grupo buscou coagir integrantes do Poder Judiciário e, mais recentemente, da Câmara e do Senado, mirando influenciar decisões em benefício próprio.
Em um dos pontos do relatório, a PF sustenta que Bolsonaro compartilhou via WhatsApp vídeos sobre as sanções dos EUA contra o Brasil, além da “divulgação e promoção de eventos”. Como estava proibido de usar as redes, mesmo indiretamente, o ex-presidente pode ter violado as restrições impostas por Moraes. Os investigadores também acharam no aparelho usado pelo político uma minuta de pedido de asilo para a Argentina, indicando uma possível fuga do país.