Após mais de 30 horas de obstrução bolsonarista, o presidente da Câmara dos Deputados, Hugo Motta (Republicanos-PB), só conseguiu reassumir a presidência da Casa na noite de quarta-feira 6 ao sinalizar que respeitará a vontade da maioria quanto à pauta da anistia aos golpistas de 8 de Janeiro e à PEC que alteras as regras do foro privilegiado.
O recuo da oposição aconteceu após uma reunião de mais de quatro horas na Residência Oficial da Presidência da Câmara, seguida por mais duas horas de impasse no plenário, onde os deputados continuavam impedindo Motta de sentar-se à Mesa. A crise só foi superada após a intervenção do ex-presidente da Câmara Arthur Lira (PP-AL), que atuou como articulador ao lado de líderes do Centrão.
PP, União Brasil, Republicanos e PSD, sob mediação de Lira, se comprometeram com a tramitação das duas pautas centrais para os bolsonaristas: o projeto de anistia – que pode beneficiar inclusive Jair Bolsonaro (PL) – e a PEC que limita o alcance do foro privilegiado, retirando da alçada do Supremo Tribunal Federal o julgamento de congressistas depois do fim do mandato.
Durante a reunião, Motta evitou firmar um compromisso direto, mas declarou que seguirá a decisão da maioria dos líderes partidários. A base do governo Lula (PT) protestou e disse que não há acordo. O Centrão, no entanto, fez a vontade dos bolsonaristas e deu sinal verde para a tramitação dos projetos.
O movimento da oposição foi impulsionado pela revolta com a decisão do ministro Alexandre de Moraes, do STF, que decretou a prisão domiciliar de Bolsonaro, e teve como pano de fundo um esforço mais amplo para reverter avanços do Judiciário sobre o Legislativo – como a imposição de tornozeleira eletrônica ao senador Marcos do Val (Podemos-ES).
“Nós construímos o compromisso com essas lideranças [o Centrão] de, na próxima semana, abrir os trabalhos da Casa pautando a mudança do foro privilegiado para tirar a chantagem que deputados e senadores vêm sofrendo por parte de alguns ministros do STF. Junto com o fim do foro, nós pautaremos a anistia dos presos políticos”, disse Sóstenes Cavalcante (PL-RJ), líder do Partido Liberal, após fim da sessão de ontem.
Apesar da euforia da oposição, Motta não definiu data para as votações. Ele também evitou confirmar se haverá sessão nesta quinta-feira 7 ou na semana seguinte. Questionada, a assessoria da Mesa Diretora informou apenas que há previsão de início dos trabalhos para às 12h de hoje, mas sem pauta definida.
Hugo Motta (Republicanos-PB) só conseguiu assumir sua cadeira após quatro horas de reunião e duas horas de impasse. Foto: Bruno Spada/Câmara dos Deputados
Nos bastidores, deputados de esquerda, centro e até da direita avaliam que Motta demonstrou fragilidade. Afirmam que a cena do presidente esperando, por cerca de seis minutos, para conseguir sentar-se à sua cadeira, sob gritos e pressões da oposição, escancarou sua falta de controle da Casa. O uso de Lira como “bombeiro” apenas reforçou a percepção de que Motta ainda não consolidou sua liderança frente a uma Câmara polarizada e cada vez mais refém de pautas radicais.