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O quadro é tão anormal que, na prática, não se tem noção do volume que supostamente seria devido pelo servidor do Governo de Mato Grosso
Os deputados estaduais têm a chance de corrigir uma situação de anormalidade e irregularidade, no que diz respeito às operações de crédito consignado e que afetam mais de 62 mil servidores do Poder Executivo de Mato Grosso. Sem se contarem aqueles de outros poderes, que também têm encontrado inconsistências que transformaram suas dívidas em superendividamento e que superlotm as prateleiras de varas especializadas no Judiciário.
O quadro é tão anormal que, na prática, não se tem noção do volume que supostamente seria devido pelo servidor do Governo de Mato Grosso, que, em alguns casos, compromete a quase totalidade dos seus rendimentos mensais.
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Neste ponto, é fundamental se reconhecer que a Mesa Técnica do Tribunal de Contas de Mato Grosso, instalada por decisão do presidente Sérgio Ricardo e comandada pelo conselheiro Valter Albano. A mesa tem a participação de Guilherme Maluf, que foi presidente da Assembleia Legislativa e presidiu a Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) dos Consignados, que resultou na aprovação da Lei 11.033/2019, promulgada pelo Parlamento, diante da omissão do Poder Executivo.
Só que o Governo Mauro Mendes (União) não se deu por satisfeito e ingressou com uma Ação Direta de Inconstitucionalidade (Adin), acolhida pelo Órgão Especial do Tribunal de Justiça. Nesse caso, optou por não entrar em colisão com o Executivo e o Legislativo e considerou a matéria como inconstitucional, por vício de iniciativa. Ou seja, bastaria que o Governo do Estado apresentasse uma nova lei ( ou a mesma lei já promulgada) para que as regras definidas após a CPI fossem acolhidas e tivessem validade.
“Se a Lei 11.033/2019 estivesse em vigor, a situação não estaria fora de controle”, disse Guilherme Maluf, ao assinalar que a lei determinava que o Governo do Estado realizasse processo licitatório para a contratação de empresas de captação de empréstimos ou para operacionalizar operações desta natureza. O que era feito por meio de um credenciamento pela Secretaria de Planejamento (Seplag),que escolhia as empresas que, então, passavam a oferecer os empréstimos e, depois, cartões de crédito e cartões de benefícios.
Mas as áresa técnica, econômica e política do Governo Mauro Mendes preferiram manter sob sua tutela a gestão das operações consignadas, que superam R$ 5 bilhões emprestados ou oferecidos por meio desse cartões, por decreto que se demonstraram falhos. Pior,r sem controle e com viés de prejudicar o servidor público.
Essa gestão era feita por decretos e gerenciada pela Seplag.
A votação do Projeto de Decreto Legislativo 13/2025, de autoria dos deputados Wilson Santos (PSD) e Janaina Riva (MDB), na pauta de votação da Ordem do Dia da 2ª Sessão Ordinária desta quarta-feira (15), seria um bom motivo para os deputados demonstrarem certa independência, já que, durante a apreciação dos vetos, os deputados aprovaram os pedidos do Governo, mesmo votando contra projetos de sua autoria.
A base de apoio na Assebleia, por sinal, é apelidada de “puxadinho” do Executivo, considerando que basta uma ordem para que o Palácio Paiaguás aprove o que interessa ao governador Mauro Mendes.
“Temos o condão de adotar uma medida em comum acordo com todos os demais poderes, para que se coloque ordem nesta situação fora de controle e se deixe de prejudicar o servidor público, o único penalizado e levado a condições extremas e de descontrole emocional”, disse Wilson Santos, para quem, se não houver uma decisão correta, há o risco de se adotarem medidas isoladas sem efeito prático.
A posição de Wilson e Janaína remete a outro Decreto Legislativo aprovado e que impedia a atuação da Capital Consig junto a operações consignadas, mas que foi suspenso por liminar do desembargador Jones Gattass Dias. Com isso, foi retomada a capilaridade da Capital Consig, que também é investigada por operações consignadas juntos aos aposentados e pensionistas do INSS, que também são alvos de investigações em CPI no Congresso Nacional;
Aliás, essa será a primeira Sessão Plenária Ordinária, desde o dia 17 de setembro, quando todas as sessão foram destinadas apenas à apreciação de vetos com mais de 30 dias na Casa. O que, segundo a legislação, tranca a pauta de votação e impede qualquer outro tipo de apreciação, mesmo em regime de urgência, urgentíssima, que é quando as matérias dispensam os prazos de apreciação. Inclusive, nas Comissões Permanentes, e vão direto para apreciação dos deputados, em Plenário, quando, principalmente, a Comissão de Constituição, Justiça e Redação (CCJR) emite parecer oral.
Além de corrigir uma distorção e uma interminável lista de irregularidades e abusos cometidos, a votação do Projeto de Decreto Legislativo 13/2025 é lastreada por uma outra medida, que pegou o Governo Mauro Mendes e suas áreas técnicas, econômica e política de surpresa. Trata-se do ajuízamento de uma Ação Civil Pública, apresentada na terça-feira (14) pela titular da 6ª Promotoria do Ministério Púlico, Valnice Silva dos Santos.
Ela alertou que as apurações apontam fortes indícios de violação ao dever de informação, práticas abusivas e lesão a direitos dos consumidores e ao erário estadual.
“O que vimos foi uma estrutura montada para enganar o servidor, disfarçando empréstimos como se fossem compras no cartão. Isso gerou dívidas que se arrastam por anos, sem que a pessoa sequer entenda como começou”, alertou a promotora, em sua Ação Civil Pública.
A medida judicial é contra as empresas do Grupo Capital Consig, que, por recomendação do Tribunal de Contas, estava com os descontos de seus supostos créditos perante os servidores públicos suspensos, em decisão acatada pela Secretaria de Planejamento e Gestão, após se constatar a pratica reiterada de irregularidades em operações de crédito consignado e cartão de benefícios voltados a servidores públicos estaduais.
Para amenizar a medida judicial e não confrontar o Poder Executivo, o Ministério Público afirmou que a Ação Civil Pública decorre das investigações realizadas no âmbito da força-rarefa instituída pelo Decreto nº 1.454/2025, criada para apurar e enfrentar práticas abusivas relacionadas a consignações no serviço público estadual.
O grupo é integrado pelo Procon/MT, Controladoria-Geral do Estado (CGE/MT), Secretaria de Estado de Planejamento e Gestão (Seplag), Polícia Judiciária Civil (Decon) e Procuradoria-Geral do Estado (PGE/MT).
Conforme Valnice Silva dos Santos, as provas reunidas demonstram que as instituições financeiras investigadas estruturaram um modelo de atuação que simulava empréstimos consignados como operações de saque via cartão de crédito, utilizando de forma irregular a margem consignável dos servidores e omitindo informações essenciais na contratação.
As investigações foram iniciadas por meio do Inquérito Civil SIMP nº 009467-001/2025, instaurado para apurar a atuação da empresa Capital Consig Sociedade de Crédito Direto S.A.. No decorrer dos trabalhos, foram identificadas outras instituições pertencentes ao mesmo grupo econômico, o que levou à ampliação da investigação.
Durante o processo, o Ministério Público buscou a resolução extrajudicial do caso, realizando quatro audiências conciliatórias (18 de agosto, 1º e 15 de setembro e 8 de outubro de 2025) com representantes da empresa e integrantes da Força-Tarefa, na tentativa de firmar um Termo de Ajustamento de Conduta (TAC). Todas as tratativas, contudo, foram infrutíferas, diante da ausência de proposta viável de reparação e de compromisso efetivo por parte das empresas.
Na última audiência pública na Assembleia Legislativa, a representante do Procon alertou que havia analisado 27 mil contratos, de um total que supera os 360 mil contratos, e em nenhum deles havia deixado de detectar algum tipo de inconsistência ou mesmo irregularidades.
Em junho deste ano, o Governo do Estado de Mato Grosso, com base nas apurações da força-tarefa e da Seplag, já havia ampliado a suspensão das empresas investigadas, incluindo ABC Card, Cartos, ClickBank, Bem Cartões e a própria Capital Consig.
A decisão, publicada em edição extra do Diário Oficial do Estado no dia 6 de junho, proibiu temporariamente novas operações e descontos em folha no sistema estadual, por 90 dias, podendo ser prorrogada.
De acordo com a Seplag, as instituições não tinham credenciamento para operar com consignações, mas mesmo assim acessavam de forma indevida a margem consignável dos servidores, configurando fraudes, conluio entre empresas e violação às normas de controle.
Com o ajuizamento da ação, a força-tarefa deliberou pelo encerramento parcial das atividades relacionadas às empresas do Grupo Capital Consig, mantendo-se, porém, ativa e em funcionamento para as demais frentes de apuração.
A promotora Valnice Silva dos Santos destacou que o objetivo da ação é responsabilizar judicialmente as instituições envolvidas e readequar os contratos irregulares firmados com servidores públicos.
“O Ministério Público continuará atuando para garantir transparência, reparar os danos causados e assegurar o respeito aos direitos dos consumidores atingidos”, afirmou.
A força-tarefa seguirá com a análise dos dados do Sistema Revisa Consignações e das reclamações registradas no Procon/MT, priorizando os casos em que houver indícios de práticas abusivas e ausência de informação adequada ao consumidor.
Resta saber se os deputados vão adotar medidas que visam proteger o servidor público, que, em suas manifestações, demonstraram interesse em quitar suas dividas, mas com valores legais e não abusivos.





