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Convênios que permitiram o Banco Master operar com consignados em Mato Grosso foram assinados pelo secretário de Planejamento, Basílio Guimarães (detalhe)
Novamente, as operações consignadas realizadas pelo Governo do Estado de Mato Grosso, que levaram 62 mil dos 104 mil servidores do Poder Executivo ao superendividamento, aparecem envoltas em irregularidades e dúvidas, que podem acabar por reforçar a suspensão definitiva nos descontos de empréstimos e cartões de crédito e de benefícios contratados por meio de consignações e que apontam para cobranças indevidas.
Após a Capital Consig e outras 10 fintechs ligadas a ela terem suspensas as cobranças dos empréstimos e cartões de crédito e benefícios contratados em operações consignadas em Mato Grosso, por Decreto Legislativo aprovado pela Assembleia, na semana passada, agora é a vez do Banco Master.
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A instituição foi liquidada extrajudicialmente pelo Banco Central, após operação da Polícia Federal, na terça-feira (18), que levou à prisão do seu dono, o empresário Daniel Vorcaro, acusado de movimentações suspeitas da ordem de R$ 12 bilhões.
O banco, que quase foi adquirido pelo Banco Regional de Brasil (BRB), em uma operação que chamou a atenção do mercado financeiro, também emprestou recursos para os servidores do Poder Executivo de Mato Grosso, por meio operações de empréstimos consignados e cartões de benefícios.
O BRB também tem operações de empréstimos consignados e cartão de benefícios no Estado. E tem uma agência na Avenida do CPA, em Cuiabá.
Reportagem do site PNB Online apurou que, desde 2023, o Governo de Mato Grosso repassou o valor total de R$ 37.667.432,95 ao Master, descontado das folhas de pagamento dos servidores.
O veículo informa que o Estado firmou dois convênios para que o banco de Vorcaro pudesse cobrar empréstimos consignados dos servidores públicos estaduais.
O primeiro, o convênio 026/2023, foi assinado pelo secretário de Planejamento e Gestão, Basílio Bezerra Guimarães, em maio de 2023.
O segundo, o convênio 106/2024, foi assinado também por Basílio, em dezembro do ano passado.
A Operação Compliance Zero, da PF, combate a emissão de títulos de crédito falsos por instituições financeiras que integram o Sistema Financeiro Nacional (SFN). Estão sendo investigados os crimes de gestão fraudulenta, gestão temerária, organização criminosa, entre outros.
O Banco Master voltou ao radar do mercado em setembro, quando o BC negou a autorização para o BR adquirir a companhia.
Segundo a Folha de S. Paulo, quando o banqueiro Daniel Vorcaro assumiu o controle do antigo Banco Máxima, que passou a se chamar Master em 2019, a instituição financeira iniciou um rápido processo de expansão de sua carteira de crédito consignado.
O balanço divulgado logo após o anúncio de compra do banco pelo BRB (Banco de Brasília), porém, mostra um desmonte de posição em um ano, com queda de 64% na carteira de consignado após a transferência de ativos.
Os investigadores que atuam na operação que resultou na prisão de Vorcaro suspeitam que o Master tenha usado o negócio com o BRB para esconder a fabricação de carteiras falsas de crédito consignado.
Nos últimos meses, em apurações de empréstimos consignados, cartões de crédito ou de benefícios, em Mato Grosso, a Delegacia de Defesa do Consumidor (Decon) e o Procon apontaram para inconsistências e irregularidades na maioria dos contratos até o momento apreciados.
As apurações também foram feitas pelo Tribunal de Contas de Mato Grosso (TCE/MT), segundo seu presidente, Sérgio Ricardo, e os conselheiros Valter Albano, presidente da Mesa Técnica instalada em cima dessas operações financeiras, e Guilherme Maluf, que propôs a implantação do exepdiente, por ter sido deputado e membro da CPI dos Consignados em 2018 e um dos autores da Lei que regulamentou os empréstimos consignados.
Estima-se em mais de 400 mil contratos realizados para os mais de 62 mil servidores do Poder Executivo, sem contar os contratos dos servidores dos demais Poderes Constituídos que fizeram mais de R$ 5 bilhões em operações financeiras.
Até o momento, não se sabe exatamente, qual é o valor total devido pelos servidores de Mato Grosso aos bancos, fintechs e agências de crédito, já que existem casos de comprometimento da quase totalidade dos salários, o que fere a regra geral, que permite um máximo de 35% dos salários como margem e, até mesmo, para questão de prazos, já que foram encontrados empréstimos com mais de 120 meses – ou seja, 10 anos.
A operação do Master com o BRB acabou não se concretizando porque o Banco Central vetou o negócio ao enxergar risco de sucessão para a estatal de Brasília.
Segundo um relatório da administração do ainda Banco Máxima de 2019, a instituição financeira começou naquela época a direcionar foco para novas formas de distribuição de crédito, destacando o consignado e o microcrédito.
Em 2021, quando houve a primeira demonstração financeira da instituição já como Banco Master, a carteira de consignado somava R$ 754,6 milhões.
Um ano depois, ao final de 2022, os empréstimos consignados do banco triplicaram, somando R$ 2,2 bilhões. A alta é de quase 200%.
Na época, a instituição financeira justificou o salto em sua demonstração financeira dizendo que havia conseguido autorização para captar créditos consignados no âmbito municipal, estadual e federal. “Destacamos a abertura destes novos convênios no Rio de Janeiro, Minas Gerais e São Paulo”, disse à época.
Em 2023, houve uma nova expansão da carteira, para R$ 2,5 bilhões, alta de 15,6%.
Um ano depois, porém, a demonstração financeira referente a 2024 mostra que o banco teve uma baixa considerável nessa linha do balanço, de 64%, com os créditos consignados passando a somar R$ 919 milhões.
O balanço diz que em 31 de dezembro de 2024 a instituição vendeu R$ 2,2 bilhões com a transferência de sua carteira de consignado, mas não informa quem seria o comprador (ou os compradores).
Ao mesmo tempo, o lucro líquido do banco dobrou, passando de R$ 532 milhões ao final de 2023 para R$ 1,068 bilhão em dezembro de 2024. Se considerar o desempenho de 2021, quando o banco registrou lucro de R$ 138 milhões, o salto foi de 87% em três anos.
Segundo reportagem da Folha, investigadores apontam que as carteiras de consignado do Master, formadas com tomadores de crédito inexistentes, foram vendidas ao banco de Vorcaro e, por fim, compradas pelo BRB em dezembro do ano passado. No início do ano, a supervisão do Banco Central identificou que existiam operações estranhas na cessão dessas carteiras.
LIGAÇÕES PERIGOSAS – No caso de Mato Grosso, a cada dia e a cada operação policial sobre empresas que emprestaram dinheiros por meio de operações de empréstimos, cartões de crédito ou de benefícios, todas elas consignadas, há suspeitas de inconsistências e irregularidades e o superendividamento dos servidores públicos de forma ilegal.
Antes da Operação Compliance Zero, deflagrada na terça-feira (18), a Operação Carbono Oculto, no fim de agosto, e que afetou o principal centro financeiro do Brasil, que são os bancos e fintechs da famosa Avenida Faria Lima, em São Paulo, demonstrou o envolvimento do crime organizado em operações financeiras para lavar dinheiro ilegal. Outras empresas que operam consignados em Mato Grosso já haviam despertado a atenção das autoridades.
Uma das envolvidas nas apurações da Carbono oculto pelas autoridades é a Reag Distribuidora de Títulos e Valores Mobiliários S/A, foi contratada pelo Governo de Mato Grosso, por meio da Desenvolve MT, para prestar serviços no mercado financeiro.
O deputado Wilson Santos (PSD), que defende a suspensão de todas as operações consignadas em Mato Grosso, com o Governo do Estado assumindo o ônus para renegociar os valores por ter falhado ao oferecer ao servidor público as empresas que agora aparecem em diversas operações policiais por irregularidades afirmou que somente “zerando” todas as operações é que se conseguirá organizar a situação.
“Temos que zerar todas as operações consignadas. Ou seja, o Governo do Estado compra essas dividas dos servidores públicos com deságio, por estar quitando de forma antecipada as mesmas, faz um pente fino no que é legal para ser quitado e aquelas que têm alguma inconsistência ou irregularidade vão ser novamente periciadas para conseguir organizar e cobrar do servidor o que é devido, mas de forma justa e com juros e regras claras, sem abusividades”, disse.
O deputado do PSd observou que o Poder Executivo tem que ser punido por ter avalizado as operações e por ter ofertado empréstimos de empresas que sequer tinham autorização para realizar operações consignadas.
Com informações da Folha de S. Paulo





