O ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) quer ter a maioria do Congresso Nacional em 2027 como forma de criar uma espécie de poder paralelo para fazer frente ao STF (Supremo Tribunal Federal). O cálculo leva em conta até mesmo o cenário em que um sucessor no bolsonarismo venceria a disputa pelo Palácio do Planalto.
Desde que deixou a Presidência, Bolsonaro vem discursando sobre a importância de eleger maioria no Senado —que tem a prerrogativa de aprovar o impeachment de ministros do STF. Mais recentemente, movimentos e declarações do ex-presidente têm demonstrado com mais clareza o que significa para ele ter o comando da Casa.
Alguns aliados dizem que Bolsonaro está mais preocupado em ter a maioria por ali do que em eleger o ocupante do Palácio do Planalto. Inelegível, ele já disse abertamente e mais de uma vez que, com a maioria do Congresso, terá mais poderes que a própria Presidência da República.
O ex-presidente também passou a falar com maior frequência em ter a maioria na Câmara dos Deputados. Apesar de a Casa não ter o poder de levar adiante o afastamento de ministros do STF, foi nela que ficou emperrada a votação do projeto de lei da anistia aos presos e condenados nos ataques golpistas do 8 de Janeiro.
Neste domingo (29), Bolsonaro realizou um ato na avenida Paulista, em São Paulo, no qual falou sobre o tema, admitindo abertamente a possibilidade de estar preso durante as eleições ou mesmo morto —cenário que passou a tratar desde entrevista à Folha em que disse que prisão seria o fim da sua vida.
“Se vocês me derem isso [50% da Câmara e do Senado], não interessa onde esteja, aqui ou no além, quem assumir a liderança vai mandar mais que o presidente da República”, disse Bolsonaro na Paulista.
“Com essa maioria, nós elegeremos nosso presidente da Câmara. O nosso presidente do Senado. O nosso presidente do Congresso. A maioria das comissões de peso no Senado e na Câmara”, afirmou a uma plateia bem inferior à de manifestações anteriores.
“Nós escolheremos não o presidente [da República], o presidente do Banco Central e todo o seu secretariado. Nós seremos os responsáveis pelo destino do Brasil”, completou.
Passarão pelo crivo do ex-presidente não apenas os candidatos do PL ao Senado, mas também a negociação da chapa com partidos aliados, como União Brasil-PP e Republicanos.
A preferência será por ao menos um nome do PL em todos os estados da federação. Onde não for possível eleger um bolsonarista raiz, a ordem é compor com um partido aliado.
A prioridade para ter apoio de Bolsonaro será de quem declarar intenção de apoiar ofensivas contra ministros do STF, mais notadamente Alexandre de Moraes. Até mesmo os suplentes desses candidatos estão sendo avaliados pelo ex-presidente.
A avaliação de interlocutores dele é que o tema da eleição no próximo ano será o embate com o Supremo. De acordo com um aliado, as negociações com partidos podem prever apoiar candidatos deles a governador ou vice em troca da escolha de nomes para o Senado.
Integrantes do PL calculam eleger 22 dos 81 senadores, mas acreditam que podem chegar a cerca de 50 com aliados de outras siglas. Nessa jogada, a presidência do Senado seria demanda do partido. Aliados citam o senador Rogério Marinho (PL-RN) como um possível nome para ocupar o cargo. Ele já foi ministro de Michel Temer (MDB) e de Bolsonaro e hoje é secretário-geral do PL.
A obsessão de Bolsonaro pelo Senado leva em conta até mesmo o cenário otimista, em que ele conseguirá emplacar um sucessor no comando do Palácio do Planalto.
Disputam o seu espólio governadores de direita como Tarcísio de Freitas (Republicanos), de São Paulo; Ronaldo Caiado (União), de Goiás; Romeu Zema (Novo), de Minas Gerais; e Ratinho Jr (PSD), do Paraná. Além deles, também é mencionada a ex-primeira-dama Michelle Bolsonaro.
Tarcísio, nome mais competitivo nas pesquisas hoje, é alvo de críticas de bolsonaristas mais radicais por não ser mais combativo com o STF. O governador tem laços com ministros da corte.
Aliados do governador dizem que ele conversa e busca pontes com o Supremo e que mantém diálogo com Bolsonaro sobre todos os gestos e movimentos que faz em relação aos ministros.
Uma ala do entorno do ex-presidente quer um sucessor mais enérgico nas suas medidas. Filho mais velho do ex-mandatário, o senador Flávio Bolsonaro (PL-RJ) deixou isso claro em recente à Folha.
“Estou fazendo uma análise de cenário. Bolsonaro apoia alguém, esse candidato se elege, dá um indulto ou faz a composição com o Congresso para aprovar a anistia, em três meses isso está concretizado, aí vem o Supremo e fala: é inconstitucional, volta todo mundo para a cadeia. Isso não dá.”
Integrantes do PL buscam minimizar a fala do senador e dizem que não é possível atuar na base da força, acionando as Forças Armadas, por exemplo. Por isso, o único caminho possível para o bolsonarismo garantir que a anistia seja efetivada seria via Senado.
Outro entendimento é que, por mais combativo que seja um eventual presidente da direita, seus poderes são limitados dentro da democracia. Bolsonaro considera o histórico da sua própria Presidência, em que muitos dos seus atos foram suspensos pela corte, como quando tentou dar indulto ao então deputado Daniel Silveira.
Há quem diga, portanto, que a principal negociação com um sucessor será no sentido de garantir que o Senado ficará sob o comando indireto de Bolsonaro, tendo carta livre para abrir frentes contra os ministros do STF.
É nesse sentido que o ex-presidente quer garantir todos os membros da sua família com uma vaga na Casa. Mesmo entusiastas de uma eventual candidatura de Michelle à Presidência avaliam que Bolsonaro pode preferir tê-la no Senado também por isso.
Mais recentemente, ele tornou pública a intenção de indicar o vereador Carlos Bolsonaro (PL-RJ) para disputar uma das vagas da Casa por Santa Catarina.
Em São Paulo, até segunda ordem, uma das candidaturas é de Eduardo Bolsonaro. O deputado licenciado tem sinalizado a interlocutores, contudo, que não pretende voltar ao Brasil –mesmo diante da possibilidade de uma candidatura à distância.
Ele teme ser preso, sobretudo se a mobilização por uma sanção contra Moraes pelo governo de Donald Trump der certo nos Estados Unidos.