Os trâmites que se seguirão à prisão da deputada federal Carla Zambelli (PL-SP), em Roma, nesta terça-feira 29, deverão se basear nas regras do direito italiano, não da Justiça brasileira, enfatiza o advogado Marcelo Válio, especialista em Direito Constitucional e pós-doutor pela Universidade de Messina, na Itália.
Zambelli era considerada foragida desde o início de junho, quando o ministro do Supremo Tribunal Federal Alexandre de Moraes expediu uma ordem de prisão. Ela fugiu dias depois de ser condenada a dez anos de prisão por invasão a um sistema do Conselho Nacional de Justiça.
Por ter cidadania italiana, Zambelli decidiu se esconder em Roma, onde se dizia “intocável”.
Segundo o artigo 26 da Constituição da Itália, a extradição de um cidadão só poderá ser autorizada “quando expressamente prevista em convenções internacionais”. O dispositivo também define que não se admite extraditar um italiano por crimes políticos — o que não é o caso de Zambelli.
“Há o tratado de extradição entre Brasil e Itália que permite essa possibilidade”, detalha Válio. “Contudo, é uma faculdade da Justiça e do país optar ou não pela extradição.”
Ou seja: o tratado não blinda Zambelli, mas o fato de ela ter cidadania italiana torna o processo mais complexo.
Segundo Marcelo Válio, caso os italianos neguem o pedido de extradição, é razoável que Zambelli cumpra sua pena na Itália, a partir de uma espécie de homologação da sentença do STF.
“Zambelli tem a possibilidade de requerer que sua pena seja cumprida em território italiano, apontando que os cárceres em território brasileiro não seguem as regras de direitos humanos, e ter a chance de permanecer na Itália — mas presa e cumprindo sua pena.”
Esgotar o fluxo legal, reforça o professor, pode levar anos, uma vez que há uma série de recursos possíveis.
Diz o artigo 1º do Tratado de Extradição Brasil-Itália:
“Cada uma das Partes obriga-se a entregar a outra, mediante solicitação, segundo as normas e condições estabelecidas no presente Tratado, as pessoas que se encontrem e seu território e que sejam procuradas pelas autoridades judiciárias da Parte requerente, para serem submetidas a processo penal ou para a execução de uma pena restritiva de liberdade pessoal”.
O artigo 6º, contudo, define que a extradição não é obrigatória quando envolve um cidadão do país requerido — aplica-se a Zambelli, cidadã italiana. Neste cenário, diz o tratado, se o pedido for rejeitado, a parte requerida submeterá o caso às suas autoridades para eventual abertura de um procedimento penal.
A decisão, portanto, está nas mãos das autoridades italianas. A palavra final caberá ao Poder Executivo.
Quando solicitou ao Ministério da Justiça o início do processo para obter a extradição de Zambelli, Alexandre de Moraes assegurou que ela não sofrerá tratamentos desumanos, a exemplo de tortura, caso a Itália autorize seu envio ao Brasil.
“A Sra. Carla Zambelli Salgado de Oliveira, de maneira livre, consciente e voluntária, comandou a invasão a sistemas institucionais utilizados pelo Poder Judiciário, mediante planejamento, arregimentação e comando de pessoa com aptidão técnica e meios necessários ao cumprimento de tal mister, com o fim de adulterar informações, sem autorização expressa ou tácita de quem de direito”, escreveu.
Moraes também assumiu, em nome do Estado brasileiro, uma série de garantias diplomáticas à Itália, como a de não submeter Zambelli a tortura ou tratamentos cruéis, desumanos ou degradantes.