Início NACIONAL o inferno de Bolsonaro em quase mil dias – CartaCapital

o inferno de Bolsonaro em quase mil dias – CartaCapital


Passaram-se 952 dias entre o momento em que Jair Bolsonaro (PL) rompeu o silêncio após a derrota para Lula (PT) — incentivando manifestações golpistas — e esta sexta-feira 18, dia em que a Polícia Federal instalou uma tornozeleira eletrônica no ex-presidente, às vésperas do julgamento da ação penal sobre a tentativa de golpe de Estado. As medidas respondem ao risco de fuga e à escalada de tensões que cercam o processo.

A operação, autorizada pelo ministro Alexandre de Moraes, não faz parte do processo sobre a trama golpista, mas de uma investigação aberta em 11 de julho, dois dias depois de Donald Trump anunciar pesadas tarifas contra produtos brasileiros. Os investigadores suspeitam que Bolsonaro tenha financiado iniciativas para ferir a soberania nacional, atuando para que um governo estrangeiro — o dos Estados Unidos — impusesse sanções ao Brasil e às suas autoridades. A estratégia, segundo a PF, buscava intimidar a Justiça brasileira e interferir em processos contra o ex-presidente.

O nome mais ativo nessa ofensiva seria Eduardo Bolsonaro (PL-SP), licenciado do cargo de deputado federal desde março. Vivendo nos EUA, ele articula com aliados para impor sanções a autoridades brasileiras. Em junho, Bolsonaro admitiu ter enviado 2 milhões de reais ao filho.

A nova investigação se sobrepõe ao processo central sobre o golpe, ampliando o cerco judicial. Agora, o ex-presidente está proibido de acessar redes sociais, deve permanecer em casa à noite e não pode se comunicar com embaixadores ou outros investigados pelo STF — incluindo Eduardo.

A escalada até o 8 de Janeiro

O cenário que levou ao ataque às sedes dos Três Poderes em 8 de janeiro de 2023 começou a ser desenhado semanas antes da posse de Lula. No início de dezembro de 2022, o bolsonarismo fervilhava em conspirações e buscava, a qualquer custo, sinais de uma ruptura institucional.

No dia 9, após semanas de reclusão desde o segundo turno, Bolsonaro decidiu aparecer diante de apoiadores no Palácio da Alvorada. Lá, endossou o discurso golpista e lançou recados aos militares: “Nada está perdido. O final, somente com a morte. Quem decide meu futuro, para onde eu vou, são vocês. Quem decide para onde vão as Forças Armadas são vocês.”

Semanas antes, em 18 de novembro, era o general Walter Braga Netto (PL), ex-ministro da Defesa, quem inflamava a multidão em frente ao Alvorada.“Vocês não percam a fé. É só o que eu posso falar agora.” Questionado por uma apoiadora sobre o “sufoco” do grupo, respondeu: “Eu sei, senhora. Tem que dar um tempo, tá bom?”

Naquele mesmo mês, veio a público um áudio do ministro do Tribunal de Contas da União Augusto Nardes, mencionando “um movimento muito forte nas casernas” e um “desenlace bastante forte na Nação” que estaria por vir. Nardes, contudo, não é alvo da ação sobre o golpe e, por decisão do ministro André Mendonça, não será investigado.

A Polícia Federal, ao revisitar os bastidores da conspiração, concluiu que as declarações de Bolsonaro, Nardes e Braga Netto não foram isoladas. Eram parte de um contexto em que o ex-presidente e aliados civis e militares recusavam-se a aceitar a saída do poder. Paralelamente, bloqueios de estradas, acampamentos diante de quartéis e milícias digitais pavimentavam o caminho para a insurreição.

Documentos apreendidos mostram que, dois dias antes daquele discurso de dezembro, Bolsonaro havia discutido a “minuta do golpe” com comandantes militares no Alvorada. O Exército e a Aeronáutica resistiram. A Marinha, segundo as investigações, sinalizou apoio. Entre as hipóteses apuradas pela PF, estava até o assassinato de Lula, do vice Geraldo Alckmin e do ministro Alexandre de Moraes.

As derrotas em série

Ainda no exercício do mandato, Bolsonaro já intuía seu destino em caso de derrota. Em 7 de setembro de 2021, lançou uma de suas declarações mais incendiárias: “[Só saio] preso, morto ou com vitória. Dizer aos canalhas que eu nunca serei preso. A minha vida pertence a Deus, mas a vitória é de todos nós”.

Depois do fracasso da trama, vieram as derrotas políticas e judiciais. Após o 8 de Janeiro, Bolsonaro passou a ser investigado como possível autor intelectual do terrorismo. Declarado inelegível por oito anos, tornou-se réu no STF por cinco crimes: golpe de Estado, abolição violenta do Estado Democrático de Direito, organização criminosa, dano qualificado ao patrimônio da União e deterioração de patrimônio tombado.

A ofensiva judicial ganhou fôlego com provas de inquéritos anteriores — fake news, milícias digitais e atos antidemocráticos — que apontavam para a mesma engrenagem golpista. O cerco apertou. Tentativas de recuperar o passaporte foram barradas de forma unânime: Moraes contou com o respaldo da Primeira Turma e, quando necessário, de todo o plenário. Um Supremo antes fragmentado passou a responder com coesão às ameaças.

À medida que o indiciamento se tornava iminente, Bolsonaro passou a defender anistia aos envolvidos no 8 de Janeiro. Menos por cuidado com os “malucos” — como ele mesmo os chamou — e mais por ver no perdão uma tábua de salvação política perante o STF. Não funcionou.

Em 26 de março, ele foi formalmente denunciado pelos cinco crimes. Na última segunda‑feira, 14, o procurador‑geral da República, Paulo Gonet, enviou as alegações finais e reafirmou o pedido de condenação para Bolsonaro e outros sete acusados do núcleo central da trama. Para o Ministério Público, o ex‑presidente era “o principal articulador, maior beneficiário e autor dos atos mais graves” contra a democracia.

O caso será julgado pela Primeira Turma do Supremo: Moraes, Luiz Fux, Flávio Dino, Cármen Lúcia e Cristiano Zanin. Somadas, as penas podem chegar a 43 anos de prisão.

Agora, monitorado por tornozeleira eletrônica e banido das redes sociais, Bolsonaro aguarda um veredicto que, no horizonte, parece cada vez mais inevitável: a prisão por liderar uma tentativa de golpe.



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