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O que significa a investigação comercial contra o Brasil ordenada por Trump – CartaCapital


O governo de Donald Trump decidiu investigar práticas comerciais do Brasil por considerá-las “desleais”. A Casa Branca escala, assim, a tensão com o setor produtivo brasileiro (e com o governo Lula), desmontando o tabuleiro comercial por razões políticas.

O republicano também usou o seu apoio ao ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) como pano de fundo para as medidas, consideradas precárias por especialistas.

A investigação será conduzida sob a Seção 301 da Lei Comercial dos Estados Unidos, um instrumento controverso que permite ao governo norte-americano investigar e punir unilateralmente práticas consideradas prejudiciais ao comércio do país.

Ferramenta inusual de retaliação comercial, a Seção 301 autoriza Washington a impor tarifas e outras medidas restritivas sem necessidade de aprovação multilateral. É um instrumento que deixa os EUA na condição de juízes, permitindo que o país defina o que considera incoerente no comércio internacional.

O Escritório do Representante Comercial dos Estados Unidos (USTR) abre uma apuração, que pode durar até 18 meses. Nesse período, o governo norte-americano analisa as práticas do país investigado e pode negociar mudanças. Caso não haja acordo, Washington pode impor sanções unilaterais.

James Green, professor titular emérito da Brown University e presidente do Washington Brazil Office (WBO), afirmou a CartaCapital que a investigação comercial representa um passo mais significativo que o simples aumento de tarifas de importação.

“Isso implica um procedimento burocrático de investigação, sendo mais difícil tirar o Brasil desse procedimento, já que ele já teria sido iniciado”, diz. “É um processo que pode levar vários meses, podendo decidir que as tarifas ao Brasil são realmente justificáveis, o que seria um desastre.”

Do multilateralismo à guerra comercial

Até o primeiro governo Trump, os Estados Unidos usavam a Seção 301 principalmente como instrumento de pressão para construir casos na Organização Mundial do Comércio. Mesmo com a ameaça global que o republicano começava a representar, o sustentáculo do multilateralismo ainda não havia sido colocado tão em xeque quanto neste momento.

A chegada de Trump ao poder em 2017, no entanto, fez com que os EUA abrissem seis investigações sob a Seção 301 — número expressivo para um período de quatro anos. O alvo principal foi a China, investigada duas vezes, seguida pela União Europeia.

As investigações chinesas resultaram em tarifas que chegaram a 25% sobre centenas de bilhões de dólares em produtos. Foi o início da guerra comercial sino-americana, que redefiniu o comércio global e forçou países como o Brasil a se posicionarem.

Agora, reeditando a noção de que os instrumentos comerciais devem ser usados como cabo de força político, o Brasil é que está na mira. 

O comunicado do USTR lista seis áreas de investigação, contestando desde políticas digitais até práticas ambientais, passando por tarifas preferenciais e proteção à propriedade intelectual.

Segundo o documento, o Brasil discrimina empresas norte-americanas de pagamento eletrônico – dada a massiva adoção do Pix –, concede tarifas mais baixas a outros parceiros comerciais e falha em medidas anticorrupção. Há também críticas à proteção de direitos autorais e patentes, uma área sensível para gigantes tecnológicas americanas.

Para Green, as acusações carecem de fundamento. No aspecto ambiental, por exemplo, são fartos os exemplos de que nos últimos anos os índices de desmatamento caíram no País, mesmo com os desafios persistentes. O tema, além disso, é praticamente ignorado pela atual administração na Casa Branca.

“É difícil conferir racionalidade a uma pessoa que, praticamente o tempo todo, está agindo de maneira irracional”, diz o pesquisador. “É uma irracionalidade contra o Brasil, que tem a ver com a pressão da extrema-direita, através de Steve Bannon.”

Para o setor privado brasileiro, a investigação tende a criar ainda mais dificuldades no acesso ao mercado americano. Empresas podem enfrentar barreiras burocráticas adicionais e questionamentos sobre suas práticas.

O governo Lula (PT), por sua vez, ainda não tem total clareza sobre como lidar com o campo minado instalado por Trump. O Palácio do Planalto acredita que a solução passa necessariamente pela diplomacia, mas já delimita as condições para uma eventual retaliação. 

Nesta quarta-feira 16, o ministro da Casa Civil, Rui Costa (PT), disse ser “inacreditável” que Trump esteja preocupado com o uso do Pix no Brasil e com a atividade comercial da Rua 25 de Março, em São Paulo, que a Casa Branca acusa genericamente de ser um dos grandes mercados de produtos falsificados.



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