O presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, disse em carta ao Congresso que as instalações nucleares iranianas atingidas no sábado (21) por um bombardeio americano abrigavam “um programa de desenvolvimento de armas nucleares” —contradizendo as agências de espionagem dos EUA, que dizem que esse programa não existe.
O documento, enviado na segunda (23) para o presidente da Casa, o republicano Mike Johnson, e publicado hoje pela Casa Branca, afirma que as Forças Armadas americanas “conduziram um ataque de precisão contra três instalações nucelares no Irã usadas pelo governo da República Islâmica em seu programa de desenvolvimento de armas nucleares”.
Não está claro em quais informações Trump se apoia para fazer essa afirmação. Em um relatório apresentado ao Congresso em março, a diretora de Inteligência Nacional dos EUA, Tulsi Gabbard, disse que o líder supremo do Irã, o aiatolá Ali Khamenei, ainda não havia tomado uma decisão sobre reiniciar o programa de armas nucleares do país persa, abandonado oficialmente em 2003.
O órgão nuclear da ONU afirma que o Irã vem enriquecendo urânio a um nível além do necessário para usos puramente civis. A Agência Internacional de Energia Atômica (AIEA) diz que Teerã possui cerca de 400 kg de urânio enriquecido a 60% de pureza.
A maioria dos reatores nucleares para produção de energia elétrica necessita de urânio enriquecido a apenas 5%, enquanto armas atômicas geralmente utilizam material com pureza de 90% ou mais. Segundo especialistas, o Irã poderia rapidamente enriquecer os 400 kg já existentes para níveis ainda maiores de material físsil.
Entretanto, a diferença crucial é que não há provas de que o regime tenha optado por seguir esse curso. Tecnicamente, o Irã ainda é membro do Tratado de Não Proliferação Nuclear (NPT), que barra a produção de armas nucleares por países que não as possuem, e tem desde 2003 um fatwa —isto é, uma opinião jurídica islâmica— emitida por Khamenei proibindo o desenvolvimento da bomba atômica por Teerã.
Oficialmente, o regime diz que seu programa nuclear tem fins pacíficos.
A carta de Trump ao Congresso americano dá a entender que o presidente ignorou as informações que tinha à disposição das agências de inteligência dos EUA ao ordenar o ataque sem precedentes contra as instalações nucleares de Fordow, Natanz e Isfahan, no Irã.
O caso levou analistas a traçarem comparações com as afirmações feitas por George W. Bush em 2003, quando buscou justificar ao mundo sua invasão do Iraque dizendo que o país tinha armas de destruição em massa. Essas armas nunca foram encontradas.
Antes do ataque contra o Irã, Trump foi questionado por jornalistas sobre o relatório de Gabbard negando a existência de um programa de armas nucleares iraniano. Na ocasião, o presidente respondeu: “Eu não ligo para o que ela disse. Eu acho que eles estão muito próximo de conseguir uma [bomba atômica]”.
Gabbard, uma aliada próxima de Trump, tentou amenizar suas afirmações ao Congresso, dizendo que a espionagem americana aponta que o Irã poderia produzir uma bomba “em semanas ou meses” se assim desejasse —um argumento também apresentado por Israel e seu primeiro-ministro, Binyamin Netanyahu.
Trump e seu secretário de Defesa, Pete Hegseth, dizem que o ataque americano “obliterou completamente” o programa nuclear iraniano. Um relatório confidencial revelado pela imprensa americana nesta terça (24), entretanto, aponta que o bombardeio teve o efeito de atrasar o programa somente em alguns meses.